sábado, 30 de junho de 2007

A janela do meu relógio

de António Torrado

Há relógios de sala.
E relógios de bolso.
E relógios de pulso.
E relógios a brincar,
que dão as horas que nós queremos.
E relógios aflitos, atrasados.
E relógios sempre adiantados, que aflição!
E relógios esquecidos das horas, parados.

E relógios de cuco.
E relógios em cacos...
-Ai que se partiu o meu relógio
Partiu-se, pronto. Não tem conserto. Ou terá?
Como posso eu saber?
Aqui nesta aldeia onde vim morar, não há relojoeiro.
Se não há relojoeiro, não posso consertar o meu relógio
Então?

Então tenho que inventar um relógio.
Como vai ser?
Já sei. Descobri um relógio de janela.
Não tem números o meu relógio de janela.
Também não tem ponteiros.
Trabalha às cores.
Trabalha assim.

Canta com o galo.
Afasto as cortinas
e espreito para o meu relógio.
Ainda é cedo.
Vou lavar-me e, quando volto,
consulto outra vez o meu relógio.
Está certo e eu estou certo com ele.

Passo a manhã sem me lembrar do meu relógio.
Há tantas coisas que fazer...
Mas, depois do almoço, demoro-me um bocadinho a olhar
para o meu relógio de janela.
Não tem números nem ponteiros,
mas um mostrador muito luminoso.
Sempre certo.

O quê? A tarde está a findar. Já?
Se assim é, não posso perder os
próximos minutos.
E fico a olhar para o meu
relógio de janela, até ser noite.

São horas de ir para a cama.
Boa noite a todos. Amanhã volta tudo ao principio
O meu relógio de janela não precisa de corda,
não precisa de pilhas.
E não se parte. E não se cansa.
Este relógio nunca para.